segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Apago o vento.

Apaga-se o vento. Fica o frio.
Entranha-se pela epiderme, arrepia-me os ossos.
A solidão apega-se a mim, mais uma vez. O desespero dos dias a passar e ver tudo parado.
O desassossego de não ver nada a virar.
Creio em mim que o problema se vai desabar em breve. Como sempre para o lado mais fraco. Tento recarregar um pequeno carregamento de energia e espero pela absolvição total.

Forço-me a reagir, mas a resposta vem lenta e tardia. Não vejo o sol, não vejo a luz. Apenas escuridão, o silêncio, esta minha necessidade de isolamento. 

Abstenho-me do mundo, refugio-me nas minhas próprias sombras e espero.
Espero que tudo fique claro, que tudo se resolva por mim. Assim tem acontecido, porque não acontecerá agora? 
Preciso de um desabafo, de um grito. Mas até a voz se apagou. Não consigo falar. 
Quero imenso falar. Não consigo falar.
E por mais pregos que crave neste caixão criado só por mim, nada me faz ver o monstro que estou a criar. 
E porque razão? Porque motivo?
O silêncio parece-me solução e a razão. 
Apago o vento novamente, deixo-me gelar.
E porque razão me suicidar quando posso, muito bem, fazer ciência? 

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

"All That I Wanted" - David Fonseca (Official Video)





How wonderful to see you here, my love

The whole world happens when you’re near, my love

The waterfalls, the northern lights above

They’re so insane and so hard to explain



You were all that i wanted, all that I needed

So don’t make me say it, It would just break it, believe me

You were all that I wanted, all I ever needed

Can’t bring myself to say it

I guess I’ll just keep this a secret

So I can keep it, keep it



The earth turns its endless spin, my love

Tornados grow but fail to win, my love

And there’s a place that I keep dreaming of

Away from here, Illogical and fearless

terça-feira, 6 de novembro de 2012

ACÔRDO ORTOGRÁFICO DA "LÍNGUA PORTUGUESA"

TEXTO HUMORÍSTICO SÔBRE O ACÔRDO ORTOGRÁFICO DA "LÍNGUA PORTUGUESA" ...Ou como assassinar uma língua, mas sem hipocrisias!

O acordo ortográfico e o futuro da língua portuguesa…

Tem-se falado muito do Acordo Ortográfico e da necessidade de a língua evoluir no sentido da simplificação, eliminando letras desnecessárias e acompanhando a forma como as pessoas realmente falam.

Sempre combati o dito Acordo. Mas, pensando bem, até começo a pensar que este peca por defeito. Acho que toda a escrita deveria ser repensada, tornando-a mais moderna, mais simples, mais fácil de aprender pelos estrangeiros .

Comecemos pelas consoantes mudas: deviam ser todas eliminadas.

É um fato que não se pronunciam.

Se não se pronunciam, porque ão-de escrever-se ?

O que estão lá a fazer ? - Aliás, o qe estão lá a fazer ?

Defendo qe todas as letras qe não se pronunciam devem ser, pura e simplesmente, eliminadas da escrita, já qe não existem na oralidade.

Outra complicação decorre da leitura igual qe se faz de letras diferentes e das leituras diferentes qe pode ter a mesma letra.

Porqe é qe “assunção” se escreve com “ç” e “ascensão” se escreve com “s”?

Seria muito mais fácil para as nossas crianças atribuir um som único a cada letra. Até porqe, quando aprendem o alfabeto, lhes atribuem um único nome. Além disso, os teclados portugueses deixariam de ser diferentes se eliminássemos liminarmente o “ç”.

Por isso, proponho qe o próximo acordo ortográfico elimine o “ç” e o substitua por um simples “s” o qual passaria a ter um único som.

Como consequência, também os “ss” deixariam de ser nesesários já qe um “s” se pasará a ler sempre e apenas “s”.

Esta é uma enorme simplificasão com amplas consequências económicas, designadamente ao nível da redusão do número de carateres a uzar. Claro, “uzar”, é isso mesmo, se o “s” pasar a ter sempre o som de “s” o som “z” pasará a ser sempre reprezentado por um “z”.

Simples não é? Se o som é “s”, escreve-se sempre com “s”. Se o som é “z” escreve-se sempre com “z” .

Quanto ao “c” (que se diz “cê” mas qe, na maior parte dos casos, tem valor de “q”) pode, com vantagem, ser substituído pelo “q”. Sou patriota e defendo a língua portugueza, não qonqordo qom a introdusão de letras estrangeiras. Nada de “k” .Ponha um q.

Não pensem qe me esqesi do som “ch” .

O som “ch” será reprezentado pela letra “x”.

Alguém dix “csix” para dezignar o “x”? Ninguém, pois não?

O “x” xama-se “xis”.

Poix é iso mexmo qe fiqa .

Qomo podem ver, já eliminámox o “c”, o “h”, o “p” e o “u” inúteix, a tripla leitura da letra “s” e também a tripla leitura da letra “x”.

Reparem qomo, gradualmente, a exqrita se torna menox eqívoca, maix fluida, maix qursiva, maix expontânea, maix simplex .

Não, não leiam “simpléqs”, leiam simplex .

O som “qs” pasa a ser exqrito “qs” u qe é muito maix qonforme à leitura natural .

No entanto, ax mudansax na ortografia podem ainda ir maix longe, melhorar qonsideravelmente.

Vejamox o qaso do som “j” .

Umax vezex excrevemox exte som qom “j” outrax vezex qom “g”- e ixtu é lójiqu?

Para qê qomplicar?!?

Se uzarmox sempre o “j” para o som “j” não presizamox do “u” a segir à letra “g” poix exta terá, sempre, o som “g” e nunqa o som “j”.

Serto ?

Maix uma letra muda qe eliminamox .

É impresionante a quantidade de ambivalênsiax e de letras inuteix qe a língua portugesa tem!

Uma língua qe tem pretensõex a ser a qinta língua maix falada do planeta, qomo pode impôr-se qom tantax qompliqasõex ?

Qomo pode expalhar-se pelo mundo, qomo póde tornar-se realmente impurtante se não aqompanha a evolusão natural da oralidade?

Outro problema é o dox asentox.

Ox asentox só qompliqam !

Se qada vogal tiver sempre o mexmo som, ox asentox tornam-se dexnesesáriox .

A qextão a qoloqar é: á alternativa ?

Se não ouver alternativa, pasiênsia.

É o qazo da letra “a” .

Umax vezex lê-se “á”, aberto, outrax vezex lê-se “â”, fexado .

Nada a fazer.

Max, em outrox qazos, á alternativax .

Vejamox o “o”: umax vezex lê-se “ó”, outrax lê-se “u” e outrax, lê-se “ô” .

Seria tão maix fásil se aqabásemox qom isso!

Para qe é qe temux o “u”?

Se u som “u” pasar a ser sempre reprezentado pela letra “u” fiqa tudo tão maix fásil !

Pur seu lado, u “o” pasa a suar sempre “ó”, tornandu até dexnesesáriu u asentu.

Já nu qazu da letra “e”, também pudemux fazer alguma qoiza:

Quandu soa “é”, abertu, pudemux usar u “e”.

U mexmu para u som “ê”.

Max quandu u “e” se lê “i”, deverá ser subxtituídu pelu “i” .

I naqelex qazux em qe u “e” se lê “â” deve ser subxtituidu pelu “a”.

Sempre. Simplex i sem qompliqasõex .

Pudemux ainda melhurar maix alguma qoiza: eliminamux u “til” subxtituindu, nus ditongux, “ão” pur “aum”, “ães” – ou melhor “ãix” - pur “ainx” i “õix” pur “oinx” .

Ixtu até satixfax aqeles xatux purixtax da língua qe goxtaum tantu de arqaíxmux.

Pensu qe ainda puderiamux prupor maix algumax melhuriax max parese-me qe exte breve ezersísiu já e sufisiente para todux perseberem qomu a simplifiqasaum i a aprosimasaum da ortografia à oralidade so pode trazer vantajainx qompetitivax para a língua purtugeza i para a sua aixpansaum nu mundu .

Será qe algum dia xegaremux a exta perfeisaum? E difícil, max naum duvidu.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Enterro

Nao importa o quanto queres enterrar o pior do teu passado quando é nele que vais valorizar as tuas glorias actuais. É nessas cicatrizes que vês o quanto feliz és hoje.

A padecer de Zolismo.

Padeço de algo. Um fenómeno que corrói todos os minutos. 
Nunca ter tido um cão é compreensível. Nunca tive realmente um cão e sempre o desejei.
Mais que isso, sempre os vi como animais. Apenas isso, que não poderia ser mais que um animal.

Após ter a Zola, tudo mudou! Virou-me todos os sentimentos ao contrário, e deixa-me com uma sensação que tenho tudo de parecido com a minha avó! 
Sempre a vi repudiar os cães, como se algo de mau se tratasse. Nunca o pensei assim tão negativamente. Até que ela me explicou a razão. A sua frieza tratava-se de um refúgio. Durante a sua juventude tinha de tratar dos cães de caça do próprio pai! Amava-os em demasia e depois via-se ficar sem eles. Sofria tanto como se de uma pessoa se tratasse. 

E eis que chego a essa conclusão. Custa-me passar horas sem poder estar com a Zola! Penso constantemente que estará a podre coitada a fazer sozinha para além de dormir e cheirar os cantos da casa a contar os minutos para chegarmos. 

Aperta-me o peito, faz-me sentir que o tempo não passa e que só quero acabar com tudo depressa para a poder abraçar.

Há quem veja isso como um defeito. Mas eu vejo-o como um fenómeno que só quem tiver animais o entende.
A Zola é a cadela mais louca, brincalhona e simpática que alguma vez tive contacto. É uma grande companheira, e faz-me sentir super cansado depois das caminhadas matinais, mas extremamente feliz quando a vejo a abanar a cauda por me ver.
Não me imagino sem ela. Mas se algum dia tiver de acontecer, vai doer muito.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Orgulhosamente confiante!

E assim faço a minha história. Começo aos poucos, devagar, calmamente, passo a passo, a traçar o meu caminho um campo tão complicado. 
O mundo da ciência é tão complicado que o número de pessoas que o abandonam é extremamente explicito. Há que se fascine antes de entrar nele mas rapidamente se afastam e deixam os seus sonhos mergulhar no fundo do baú. 
De conferência em conferência fui ganhando conhecimentos, não apenas de matéria científica, mas sim pessoalmente com grandes cientistas que por este mundo andam. E provavelmente também começaram assim, calmamente, devagar e com muita esperança. 

Este ano foi de imensas emoções! O facto de estar a acabar o meu doutoramento, de me estar a aproximar da data final, ter imensas coisas para acabar, imensos dados científicos para tratar e publicar,  e ainda de ver datas e teses para escrever, assusta! E deixam-me nervoso 24 horas por dia. É o que sinto neste momento, um nervoso miudinho crónico, que me faz tremer a cada passo. Mas este ano, apesar de tudo, tem sido revelador de potencialidades que eu desconhecia da minha pessoa. Falar para o público, no meio dos tais dinossauros científicos, para eles, tornaram-me mais confiante. Fico com aquela sensação de missão comprida mas especialmente com a sensação de trabalho feito com mérito. Não apenas pessoal, porque estou rodeados por orientadores e colegas que me apoiam, ensinam, ajudam e me fazem explorar ao máximo as minhas capacidades.

E assim vou fazendo história, a minha mesma. 
Comecei com a Coreia do Sul, onde para uma pequena palestra de 40/50 pessoas me senti bem, apesar da tremida voz inicial para quem apresentava a primeira vez numa conferência científica. Depois foi na França, onde para 90 ou mais pessoas me superei a mim mesmo, onde falei com uma convicção, uma confiança, uma força que não sabia que tinha. E fui galardoado por isso. Não só pela imensidão de pessoas interessadas após a apresentação, as muitas ofertas de ideias e colaborações, e ainda com um prémio de Cientista Jovem na área de bioseparação. Hoje é uma peça de decoração no meu gabinete e um ponto de relevo no meu currículo. Estou orgulhoso! Sinto-me ainda mais motivado para tudo, mas com uma peso de responsabilidade enorme para os próximos meses.
O futuro? Não sei, sei que hoje estou feliz e bem. Resta-me continuar e pensar que já cumpri um sonho, pequeno, mas um dia ainda vou ser celebrado pelas minhas conquistas!
Obrigado a todos.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

My sweet 16!



Sweet 16!
Provavelmente o meu melhor aniversário de sempre! 16 anos, coliseu do Porto e um grande concerto de Bush acompanhado pelas minhas primas! E assim passei a idolatrá-las o resto da vida! Se não fosse assim nem sequer gostava delas hoje em dia :p

Obrigado!

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

I could never run away from you.

You are the sun and moon and stars, are you
And I could never run away from you

You try at working out chaotic things
And why should I believe myself, not you?

It's like the world is going to end so soon
And why should I believe myself?

You, me and everything caught in the fire
I can see me drowning, caught in the fire

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

5 anos de eterna paciência.


I don't know where you came from 
but I do know that I'm not alone 
be sure that I love you darling 
even though sometimes we won't get along 
there's not a day that passes by, my dear 
that I don't think of the first night we spoke 
and those words are staying upon your skin 
along with that precious smile of hope 

that's why I'm like wait, wait, wait 
don't know you know I could be your home? 
I'm like wait, wait, wait 
cause nobody wants to be alone 

lying there on the kitchen floor 
were the last signs of a helpless soul 
and she knew that he would die right then 
and so she held him until the last breath grew old 
and so she cried as her darling slept 
in between her arms, slid to the floor 
and then she screamed out into the cold, cold night 
oh my God, please don't go 

she was like, wait, wait wait 
I love you more than you know 
she was like, wait, wait, wait 
I don't wanna be alone 

oh, oh, oh, oh, oh, oh (ahem) 
that's why I'm like, wait, wait, wait

5 anos de eterna paciência! 


segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Esta minha viagem constante.

Vivo hoje, como desde à 3 anos, a maior etapa e viagem da minha vida.
Cada vez que penso nesta aventura quase que me trato mal. Mas no global, hoje sou uma pessoa muito diferente, para muito melhor em tudo. 



Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.

Fernando Pessoa

Coreia. Já fui e já vim.

Fui e já cheguei.
A viagem pela Coreia do Sul foi um espanto, um sucesso pessoal, profissional e cheguei carregado de vontade para mais (apesar do cansaço e jetlag).
Um país perto da maravilha. Uma beleza incrível, ao nível do mágico quando nos aproximámos da história que por detrás leva os samurais e budismo como o mais popular.
As ruas limpas, um civismo muito diferente do que esperava. E agora sim, posso dizer que os chineses são tudo o que eu continuo a pensar mas agora resume-se só ao país em si e em nada à Ásia.
Obrigado Coreia, por tudo. Obrigado pela conferencia, pela oportunidade, pelas boas noticias, e mais do que tudo, obrigado pelos preços tão apelativos a fazer-me gastar dinheiro.



Wolfmother - Full Concert



Que belo achado...

terça-feira, 11 de setembro de 2012

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Vai chegar o dia.

Vai haver um dia, um daqueles que sempre esperamos.
Vai haver aquele momento, único, memorável.
Vai haver o barulho da garrafa, dos copos, do sorriso nos nossos rostos.
Esse dia vai chegar, seja agora ou depois,
Mas vai chegar. E aí sim, veremos um futuro risonho, longo e com esperança.


murganheira 3

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Amo-te, Portugal

Portugal, 

Estou há que séculos para te escrever. A primeira vez que dei por ti foi quando dei pela tua falta. Tinha 19 anos e estava na Inglaterra. De repente, deixei de me sentir um homem do mundo e percebi, com tristeza, que era apenas mais um dos teus desesperados pretendentes. 

Apaixonaste-me sem que eu desse por isso. Deve ter sido durante os meus primeiros 18 anos de vida, quando estava em Portugal e só queria sair de ti. Insinuaste-te. Não fui eu que te escolhi. Quando descobri que te amava, já era tarde de mais. 

Eu não queria ficar preso a ti; queria correr mundo. Passei a querer correr para ti - e foi para ti que corri, mal pude. 

Teria preferido chegar à conclusão que te amava por uma lenta acumulação de razões, emoções e vantagens. Mas foi ao contrário. Apaixonei-me de um dia para o outro, sem qualquer espécie de aviso, e desde esse dia, que remédio, lá fui acumulando, lentamente, as razões por que te amo, retirando-as uma a uma dentre todas as outras razões, para não te amar, ou não querer saber de ti. 

Custou-me justificar o meu amor por ti. És difícil. És muito bonito e és doce mas és pouco dado a retribuir o amor de quem te ama. Até dás a impressão que tanto te faz seres odiado como amado; que gostas de fingir que estás acima disso, olhando para os portugueses de agora como o céu olha para os passageiros nos aviões. 

Já que estava apaixonado, sem maneira de me livrar - nem sequer voltando para ti e vivendo contigo mais trinta anos - que remédio tinha eu senão começar a convencer-me que havia razões para te amar. 

Encontram-se sempre. E, a partir de certa altura, quando já são seis ou sete razões que se foram arranjando ao longo dos anos, deixamos de amaldiçoar este amor que nos prende a ti e, inevitavelmente, começamos a sentir-nos, muito estúpida e secretamente, vaidosos por te amarmos. Como se fôssemos nós que tivéssemos sido escolhidos. 

Digo nós mas falo por mim. Digo eu sabendo que não sou só eu, que nós somos muitos. Possivelmente todos. Tragicamente todos, um bocadinho. Se calhar estamos todos, de vez em quando, um bocadinho apaixonados por ti. 

A tua pergunta bocejada, de país farto de ser amado, amado de mais, aborrecido com tanto amor, apesar da merda que tens feito e da maneira como nos pagas, é sempre a mesma: «Diz-me lá, então, porque é que me amas...» 

Pois hoje vou-te dizer. Não me interessa nada a tua reacção. Estás a ver? Já comecei a mentir. É sinal que a minha carta de amor já começou. 

Amo-te, primeiro, por não seres outro país. Amo-te por seres Portugal e estares cheio de portugueses a falar português. Não há nenhum outro país, por muito bom ou bonito, onde isso aconteça. 

Mesmo que não achasse em ti senão defeitos e razões para deixar de te amar, preferia isso, mesmo deixando de te amar, a que não existisses. 

Se deixasses de existir, o meu olhar ficava de luto e nunca mais podia olhar para o resto do mundo com os olhos inteiramente abertos ou secos ou interessados. 

Para que continuasses a existir, mesmo fazendo cada vez mais merda, trocava imediatamente ir-me embora de ti e nunca mais poder voltar e nunca mais poder ver-te, e nunca mais encontrar um português ou uma portuguesa, e nunca mais poder ler ou ouvir a língua portuguesa. 

E olha que este é um desejo que muitas vezes tenho. 

Esta é a única verdadeira prova de amor: fazer tudo para que sobreviva quem se ama. Mesmo que nunca mais te víssemos, Portugal, saberíamos que continuavas a existir, que as nossas saudades teriam onde se agarrar. Por muito que mudasses, mal te deixássemos e nunca mais te víssemos, já não mudavas mais.

Mesmo que não houvesse em ti um único pormenor que não houvesse nos restantes países do mundo, que são muitos; mesmo que houvesse um país escondido que fosse igualzinho a Portugal em todos os pormenores; mesmo assim eu amar-te-ia como se fosses o único país do mundo, diferente em tudo. 

Portanto, já viste, ó Portugal: não preciso de nenhuma razão para te amar. Amo-te sem razão. Amo-te às cegas, antes sequer de olhar para ti. Podes ser o pior país do mundo, ou o melhor, ou o mais monotonamente assim-assim. Não me interessa. Amo-te. Amo-te à mesma. Amo-te antes de falarmos nisso. 

Amo-te tanto que, quando perguntas porque é que eu te amo, não fico nervoso nem irritado. Não preciso de tentar dar uma razão convincente. Amo-te à mesma, fiques ou não convencido.

E, mesmo que te aborreças de ouvir todas as razões que tenho para te amar, eu continuarei a dizê-las, porque gosto de dizê-las e porque, que diabo, também eu preciso, às vezes, de me lembrar e de me convencer do quanto eu te amo. 

Amo-te mesmo que sejas impossível de conhecer ou de descrever. Isto é muito importante. O Portugal que eu conheço e descrevo é apenas o Portugal que eu julgo, se calhar, conhecer (pouco) e descrever (mal). 

Cada pessoa apaixonada por ti está apaixonada por um Portugal diferente do meu. Até o meu Portugal é, conforme os climas, bastante diferente do meu - para não dizer estrangeiro. 

Por exemplo, uma das razões por que te amo é o teu clima. Acho que tens um bom clima. Mas não julgues que há muitos portugueses apaixonados por ti que concordam comigo. Esses julgam o teu clima dia a dia e hora a hora e gostam dele, quando muito, vinte por cento do ano. Em cada cinco horas do teu clima, gostam de uma e odeiam quatro. 

Pois eu amo-te sem saber sequer se o teu clima é bom ou mau. Não tenho a certeza, mas não interessa: amo-te mesmo ignorando tudo a teu respeito. Amo-te mesmo estando completamente enganado. A pessoa convencida sou eu. Quem está convencido que ama, quando fala do seu amor, não quer convencer ninguém. Quer declarar que ama. Se é bom ou mau nem secundário é. Fica noutro mundo, onde vivemos. 

Como vês, não preciso de razões para te amar. Mas tenho muitas. E boas. A primeira delas é secreta e embaraça-me confessá-la: amo-te, Portugal porque, não sei como e contra todas as provas e possibilidades, acho que és o melhor país do mundo. 

Pronto. Está dito. É uma vergonha pôr as coisas de uma maneira tão simples. Mas era isto que eu estava há que séculos para te dizer: amo-te, Portugal, por seres o melhor país do mundo. 

Como vês não sou o romântico que estava a fingir ser, que te ama sem precisar de razões para isso. Tenho uma razão muito interesseira para te amar: acho que és o melhor país do mundo. Por muito relativista que eu seja noutras coisas, acho mesmo que tive sorte de nascer aqui. Em ti. Aqui, entre nós. 

Desculpa. 

Mesmo assim, insistes em perguntar: que tens tu de tão especial, que os outros países não têm? 

Essa íntima vaidade, por exemplo. Tu não és orgulhoso. Mas, muito bem disfarçada, tens uma vaidade sem fim. Dizes-te feio e vestes-te mal mas, quando passas por um espelho, espreitas e achas-te giro. E se alguém te diz que és feio e estás mal vestido, não ficas ofendido - achas que aquela pessoa é obviamente estúpida e não tem olhos na cara. 

Ou, pelo menos, não tem o discernimento e o bom gosto necessários para apreciar a tua oblíqua mas inegável formosura. A tua beleza, estás convencido, está reservada para os apreciadores. A ralé passa ao lado e não vê: deixá-la passar. 

A tua vaidade é tanta que até te permites um grande desleixo. Sabes que, na terra onde nada plantaste, há-de crescer um jardim preguiçoso que um dia será selvagem e bonito, sem qualquer esforço teu. Deus e o tempo trabalham por tua conta. 

Sabes que a tinta fresca salta muito à vista e que é cansativa. Esperas, despreocupado, pela beleza que há-de vir com a passagem dos tempos. E a vaidade que sussurra, preguiçosamente, a quem insista em aproximar-se: «Sim, eu sei que sou uma casa bonita e não, não me lembro da última vez que fui pintada. Eu cá não preciso de me abonecar.» 

Graças ao desleixo que a tua vaidade consente, mudas menos do que os outros países. As pessoas acham que és conservador, que és contra a mudança. Mas não é isso. És vaidoso e preguiçoso porque achas que não precisas de grandes esforços ou mudanças: sabes que continuas encantador. 

O teu desleixo também é causa de muito sofrimento mas não é numa carta de amor que vou falar dele. Também tem consequências agradáveis. 

Por exemplo, dizes que queres ser um país de primeira categoria. Mas sabemos todos que não queres. Gostas de ser de segunda, como gostas de não ser de terceira. Gostas de ter países melhores do que tu, para visitar ou invocar, quando fazes aquela fita de lamentar que não seja possível teres tudo o que tens de bom, menos tudo o que tens de mau, trocado pelo melhor que houver nos outros países. 

Tu não queres nada a não ser que gostem de ti. E não estás disposto a fazer nada por isso. Nem é preciso serem muitos a gostar. Se calhar, até te bastava um. Aposto que é essa a impressão que consegues dar a cada um dos desgraçados, como eu, que estão apaixonados por ti. 

Eu poderia perder anos a fazer um cuidadoso retrato de ti. Por muito verosímil que fosse, davas uma olhadela e dizias com desdém, a fazer-te caro ao mesmo tempo: «Isso não sou eu. Isso é outro país qualquer que inventaste...» 

É a tua maneira, Portugal amado, de garantir que continuaremos a tentar retratar-te. Tanto te faz que o retrato seja feio ou bonito, desde que seja de ti. 

Quanto mais variados forem, mais gostas. Até tu, nas tuas paisagens, varias e hesitas tanto e recusas-te a decidir, como quem não tem pressa e, no fundo, não escolhe nem decide, porque quer tudo. 

Preferias ser amado por quem tem razões para te odiar? Isso sei eu. Paciência. Eu amo-te porque mereces. Eu amo-te pelas tuas qualidades. Preferias não tê-las. Para que o amor fosse mais puro, mais contraditório, mais injustificável. Mas tens qualidades. 
Desculpa lá dizer-te isto, Portugal, mas amar-te é uma coisa simples. 

Amo-te, aconteça o que acontecer. Amo-te por causa de ti. Não é apesar de ti. É por causa de ti. Não há outra razão. Nem podia haver uma razão mais simples. 

Por muito que te custe ouvir (apesar de eu saber que não só não te custa nada como gostas de ouvir), digo-te: é tão grande o meu amor por ti que até consigo amar-te sem dar por isso. 

Já viste? 

Miguel 


Miguel Esteves Cardoso, in 'Jornal Público' (10 Junho 2011)


ucanha 4

Factores duvidosos

Ginásios, gajas com calcinha apertada e espelhos. Alguma coisa estranha une estes 3 factores!