Há 40 anos, John Lennon clamava hereticamente que os Beatles eram mais famosos que Jesus Cristo. Disse-o com bazófia, sobretudo isso, mas também como crítica a uma Igreja que, segundo ele, se afastava dos seus objectivos iniciais. Num tempo marcado por muita contestação e profundas mudanças de comportamento, a Igreja pôs as garras de fora e comandou uma gigantesca operação contra os Beatles, apelidando-os de ser um banda satânica e de os seus membros levarem uma vida dissoluta - a única coisa que, realmente, era verdade. Tantos anos depois, o órgão oficial do Vaticano vem absolver a banda, num artigo que segundo os especialistas só poderia ser publicado após o aval do Papa.
Pois bem, em 2010, segundo "L'Oservatore Romano", é verdade que os Beatles se drogavam e tinham vidas pouco recomendáveis, mas as suas músicas ficaram como o fenómeno mais duradouro, consistente e representativo da história da música pop, resistindo ao tempo como "jóias preciosas".
Esta absolvição dos Beatles parece ridícula. Vem tão fora do tempo que diz bem, entre outras coisas, da necessidade de a Igreja se ir adaptando. E, bem ao seu jeito, o que a Igreja faz não é autocrítica: o Vaticano lança o seu perdão onde antes criara um anátema.
Sendo ridículo, este gesto só merece referência porque surge numa altura em que sobre a Igreja recaem acusações graves de protecção a padres pedófilos, problema que a Igreja tem sempre negado e escondido e com o qual começa a lidar de maneira diferente. Já se ouviram, mas não com o uníssono que é necessário exigir à hierarquia católica, alguns pedidos de perdão, já se ouviram, anteontem, instruções de Roma no sentido de que, ao ter conhecimento de casos, a Igreja deve, perante provas indubitáveis, suspender os seus pastores. É uma boa decisão. Se as comunidades confiam nos padres é bom que saibam que a Igreja não mantém em funções quem não possa merecer a confiança dos que a procuram. Não tem sido assim. Mas, sendo uma boa medida, visa apenas o futuro. Continua a faltar à Igreja tentar restabelecer uma relação - a relação possível - com os que foram maltratados e sofreram em silêncio.
Habituada a absolver, a Igreja tem rapidamente de aprender a pedir perdão, indo para além do gesto retórico. É preciso que tenha acções preventivas, punições claras e denuncie às autoridades civis os seus sacerdotes criminosos. Só assim o pedido de perdão será convicto, e só assim a Igreja não quebrará a relação de confiança que por todo o Mundo mantém com milhões de pessoas.
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