terça-feira, 29 de novembro de 2011

“Ah boca linda” ou “hey, beautiful mouth”!

Em época de crise, vamos lá ver se conseguimos capitalizar alguma coisa com o nosso fado, à semelhança, por exemplo, do que fez a Argentina com o seu tango




O Comité Internacional da UNESCO, composto por 24 países, declarou, dia 27 de Novembro, em Bali, na Indonésia, o fado como Património Imaterial da Humanidade. Tudo começou em 2004 com Pedro Santana Lopes, antigo presidente da Câmara Municipal de Lisboa, que lançou a ideia da candidatura do fado e escolheu Carlos do Carmo e Mariza para embaixadores desta expressão artística. Daí à elaboração de um dossier e à consequente candidatura foi um passo de alguns anos. Numa era em que o capitalismo está em iminente decadência, se calhar faz todo o sentido louvar o pós-material como alternativa ao concreto (pois também há muito que nos preparamos para a era do pós-petróleo).
Ouvi uma vez, a Sónia Tavares dos “The Gift” dizer (no programa “Bairro Alto” da RTP2) que não gostava de fado, fiquei surpresa, porque penso que nunca tinha ouvido alguém assumi-lo publicamente. A grande maioria das pessoas tem inevitavelmente no círculo de amigos alguns que manifestam o seu desinteresse por esse estilo musical, contudo sempre senti que havia um certo pudor em assumi-lo. O fado é aquele tipo de coisa que normalmente pertence ao gosto mais maduro, pois 90% das crianças gostam tanto de ouvir fado como dos legumes e do peixe cozido no prato ou de oscular aquela tia com buço.

Eu também não sou uma apreciadora de fado (se calhar ainda não amadureci o suficiente), pronto está dito, mas fico muito satisfeita pelo reconhecimento internacional, pois tenho noção do mérito, apenas não sinto afinidade com o género musical. E tenho também noção que, num universo cada vez mais globalizado, o fado é uma das expressões privilegiadas da nossa identidade.

Reconheço na Amália a maior voz portuguesa, capaz de transmitir o indizível. E sinceramente tenho pena de não ter tido a oportunidade de lhe lançar publicamente um “Ah boca linda!" ou, agora, depois deste reconhecimento internacional, “Hey beautiful mouth!”.

Se até há bem pouco tempo o fado era uma espécie de genética familiar, germinada nas grandes casas, hoje em dia há várias escolas onde se aprende este género musical (na Associação cultural “O Fado” em Chelas; na escola de fado de Odivelas; em Alverca existem também duas escolas de fado; e no próprio Museu do fado). Por isso, se calhar mesmo sem grande talento, basta ter uma alma lusa e alguma persistência para se revelar em nós o tal "poucachinho" de Amália. Em época de crise, vamos lá ver se conseguimos capitalizar alguma coisa com o nosso fado, à semelhança, por exemplo, do que fez a Argentina com o seu tango.

Texto de Cláudia Lucas Chéu • 28/11/2011 - 15:19 
ARTIGO: p3

Contudo, apesar da minha igonância para o estilo músical que o fado é, aprecio a capacidade de transmitir o que de todo é impossível normalmente noutros estilos músicais. E esta é uma delas:

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